Empresário se transformou num ator político de 1ª grandeza, goste-se ou não dele, e isso cria uma blindagem a eventuais retaliações
Qualquer que seja o resultado das eleições nos Estados Unidos, o grande vencedor é o empresário Elon Musk. Se o republicano Donald Trump ganhar, ele vira uma espécie de vice-rei na Casa Branca, com poderes para opinar no que bem entender. Caso a democrata Kamala Harris seja a vitoriosa, Musk também ganha por mais paradoxal que possa parecer. Num eventual governo democrata, Musk terá credenciais que não tinha para criticar porque não havia conquistado o peso político que passou a ter depois dessas eleições.
Nenhum democrata terá coragem de retaliá-lo ou de romper contratos que assinou com as empresas dele, sobretudo a SpaceX e a StarkLink, que têm negócios bilionários com a Nasa e o Departamento de Defesa. Musk pode ser acusado de tudo, de ser racista, intolerante, de incitar ao ódio, de prestar tributo aos nazistas ao vestir um boné com as letras que a SS usava, mas não é burro. Ele se jogou na campanha de Trump como nenhum outro empresário havia feito porque queria ganhar um status político que não tinha. Sagaz esse Musk. Graças a esse novo peso específico, criou uma couraça contra retaliações dos seus adversários.
Musk já tomou uma vacina em caso de vitória de Kamala Harris. Em entrevista ao jornalista Tucker Carson, o empresário disse: “Se ele perder, estou fodido”. Os 2 caem na gargalhada. Carson é tão trumpista quanto Musk, que o contratou para levar o seu programa para a rede X. Depois, Musk brinca que poderia ser “jogado na prisão” por Kamala se ela vencer as eleições. É óbvio que ninguém vai atirar Musk na prisão. Ainda mais depois dessa entrevista. Seria transformá-lo em mártir. É tudo que Musk quer.
O empresário tem interesses variados no governo norte-americano. Só a SpaceX tem contratos no valor de US$ 15,4 bilhões com o governo dos Estados Unidos, segundo levantamento publicado em outubro pelo New York Times. A maior parte deles, de US$ 11,8 milhões, é com a Nasa. Em junho, a empresa ganhou um contrato de US$ 843 bilhões para trazer de volta à Terra a Estação Orbital. A SpaceX vai destruir a estação em 2030 de maneira controlada, mas partes serão salvas para fins históricos.
Musk ainda não havia se jogado de cabeça na campanha de Trump, mas dizia cobras e lagartos da administração de Joe Biden e dos democratas. Com o Departamento de Defesa, a SpaceX tem negócios no valor de US$ 3,6 bilhões, ainda de acordo com o levantamento do jornal norte-americano.
A Nasa é tão dependente da SpaceX que a mudança de governo não faz a menor diferença. A agência espacial até tentou colocar a Boeing no mercado de foguetes reutilizáveis, mas o resultado foi um desastre. A Starliner, da Boeing, teve tantos problemas para levar 2 astronautas para a Estação Orbital que eles devem ser resgatados em fevereiro pela SpaceX, um vexame para a Boeing.
Esses são os negócios de Musk para lá de consolidados com o governo dos Estados Unidos. Ele parece mais preocupado com novos negócios. E aí, faz todo sentido o modo militante que ele adotou na campanha de Trump. A principal preocupação dele são os carros sem motorista, um negócio em que ele está jogando a Tesla de cabeça para ganhar o mercado futuro, já que os chineses estão tomando em velocidade assustadora o mercado atual dos carros elétricos.
Os carros sem motorista têm uma dependência dupla de governos: precisam de infraestrutura tecnológica (estradas preparadas) e regulamentação. A Tesla tem inovações de todos os gêneros em carros elétricos, mas tem enfrentado problemas sérios com veículos totalmente automatizados. Há 2 semanas, as autoridades dos EUA anunciaram que iriam investigar o sistema da empresa, chamado FSD (Full-Self Drive) depois que foram reportados 4 acidentes, 1 deles com morte. Há no mercado norte-americano 2,4 milhões de Tesla com esse sistema.
O anúncio da investigação foi feito por mero acaso uma semana depois de Musk ter anunciado um carro que não precisa de motorista, o robotáxi. O mercado debochou do veículo não por conta de problemas de automatização, mas por 2 erros primários: o robotáxi só comporta 2 passageiros e não tem um compartimento digno de ser chamado de porta-malas. Ou seja, não serve para táxi.
Na 3ª feira (5.nov.2024), uma notícia mostrou o quanto Musk está obcecado com carros totalmente automatizados. Uma das promessas da Tesla era fazer um carro de classe média, cujo preço giraria em torno de US$ 25.000, os carros da empresa já foram chamados de “toy car” de milionário e atualmente custam no mínimo US$ 39.000, mas podem chegar a US$ 113 mil.
A agência de notícias Reuters disse que o projeto estava atrasado, como ocorre com praticamente todos os planos da Tesla, e isso é normal para quem trabalha com inovação e alavancagem no mercado de ações. Musk correu para dizer que a “Reuters está mentindo”. É que o carro de US$ 25.000 sofreu uma mudança de projeto. Ele só faz sentido, segundo Musk, se não precisar de motorista.
Com governo amigo, o carro de US$ 25.000 sem motorista fica muito mais fácil. Mas os democratas não vão colocar empecilho para um produto tecnológico popular. Seria um tiro no pé.