Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Quando Pazuello assumiu, país registrava cerca de 15 mil mortes por covid e 230 mil casos. Quando saiu, os infectados eram 12,2 milhões e os mortos, 300 mil

Em sua inquirição ao ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirmou que a gestão do ex-ministro e general Eduardo Pazuello representou uma “verdadeira intervenção militar” na pasta. O senador quis saber se essa “ocupação” levou algum beneficio ao serviço e se, com a militarização, o ministério da Saúde passou a trabalhar melhor. A resposta de Dias foi que “não teve nenhuma melhora”. O depoimento do primeiro ouvido da CPI que acabou detido, na quarta-feira (7), deixou claro, segundo senadores, que as principais decisões do ministério, inclusive em relação às vacinas, eram tomadas pelo coronel da reserva Élcio Franco, secretário-executivo do Ministério da Saúde na gestão Pazuello, o número 2 na hierarquia.

Com Pazuello, militarização da saúde cresce

Desde a chegada de Pazuello, de confiança do presidente Bolsonaro, militares passaram a ocupar cada vez mais cargos em diversos níveis. O número deles chegou a 25 em junho do ano passado. Élcio Franco foi nomeado secretário-executivo com a chegada do general e sua “expertise” em logística. Por sua vez, Franco nomeou o tenente-coronel Alex Lial Marinho na Coordenação de Logística e o coronel Marcelo Blanco como assessor de Roberto Dias, que o citou como o homem que levou Domingueti à reunião no shopping para tratar da vacina indiana Covaxin. Por outro lado, os civis da área da saúde nomeados pelo então ministro general, em plena pandemia, eram defensores de tratamento precoce e outras formas de “combate” ao vírus fora dos protocolos científicos.

Élcio Franco

O ex-secretário executivo foi exonerado do ministério em março passado, mas nomeado assessor especial da Casa Civil menos de um mês depois. Na oitiva mais tensa realizada pela comissão até a última quarta-feira, o senador Randolfe Rodrigues afirmou que o dado mais importante levado por Dias à CPI foi que o depoimento apontou a responsabilidade final na contratação de vacinas contra a covid como sendo de Élcio Franco. O que quer dizer que, de acordo com Dias, o coronel estaria ligado ao caso da Covaxin, que implica a participação da “intermediária” Precisa Medicamentos. O coronel Franco passa a figurar “como foco das investigações da CPI”, afirmou o senador do Amapá, e será necessário ouvi-lo novamente.

“Estavam querendo o núcleo militar para tomar conta do galinheiro”, disse a senadora Simone Tebet (MDB-RS) durante o depoimento de Roberto Dias. Ela declarou acreditar que a CPI já tem “a materialidade” do crime relativo à Covaxin. “Estamos atrás da autoria. A Covaxin vai ser o grande calcanhar de Aquiles do governo”, acrescentou. “Eles (Pazuello e Élcio Franco) citaram ‘cláusulas leoninas’ da Pfizer, uma vacina cientificamente comprovada e hoje aplicada o mundo inteiro.”

Segundo a CPI, Élcio Franco é o principal responsável operacional pelo “banho-maria” em que foi colocada a Pfizer nas negociações da vacina. Enquanto a Pfizer ficava no “banho-maria” e a CoronaVac era atacada pelo próprio presidente da República, as negociações pela Covaxin andavam rapidamente. O contrato com a Pfizer levou 330 dias para ser fechado, enquanto com o imunizante indiano consumiu meros 97 dias.

Dois núcleos

À CPI, em 9 de junho, entre muitos pretextos, o ex-secretário executivo tentou justificar tratamento ao imunizante norte-americano com a seguinte frase: “Nem ela (Pfizer) confiava no que ela estava oferecendo pra gente”. Hoje, a vacina norte-americana é considerada a mais eficaz contra o Sars-Cov-2.

O depoimento de Roberto Dias deixou claro, segundo Randolfe Rodrigues em coletiva logo após a oitiva, que existiam “dois núcleos em disputa” no Ministério da Saúde: o que era dirigido por Dias e o comandado por Franco. “É uma disputa de poder, e eu diria, pelo controle dos esquemas de corrupção no Ministério da Saúde.”

Ouvida na quinta-feira (8), a ex-coordenadora do Plano Nacional de Imunização (PNI) Francieli Fantinato disse que deixou o Ministério da Saúde por motivos pessoais, mas ressaltou: “Existe uma politização do assunto, por meio do líder da nação, que traz elementos que muitas vezes colocam (a vacinação) em dúvida”. “Para uma campanha de vacinação funcionar precisa ter vacina e campanha publicitária. Infelizmente, eu não tive nenhum dos dois.”

Fonte: RBA