Masaki Kobayashi conseguiu encapsular em Harakiri o coquetel perfeito de vingança, drama, reviravoltas e samurai.
Há momentos em que o mundo do cinema na internet lhe traz uma agradável surpresa. Embora algumas listas de melhores filmes da história não mudem, como a do IMDb, onde a briga pelo primeiro lugar fica entre Um Sonho de Liberdade e O Poderoso Chefão, no Letterboxd, aplicativo onde milhões de cinéfilos pelo mundo avaliam suas visualizações, as coisas variam bastante. Ao longo dos anos, o primeiro lugar foi O Poderoso Chefão, Parasita, Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo, Homem-Aranha: Através do Aranhaverso, Vá e Veja e, agora, uma obra-prima indiscutível do cinema japonês.
Embora os filmes atuais apareçam de vez em quando, é uma surpresa que o Letterboxd rompa com a hegemonia do cinema norte-americano para se abrir a outras filmografias. É o caso de Harakiri, de Masaki Kobayashi, um daqueles filmes raríssimos que gelam o sangue, crescem com você e ficam para sempre na sua alma.
Kobayashi dirige um filme de samurai que tem a desonra e a vingança como base cheia de reviravoltas na trama e também perfeitamente acessível a todos os tipos de público. Um puzzle em que cada cena acrescenta uma nova peça para resolver que revela muito mais sobre si, mas que não foge às clássicas lutas de samurais ao melhor estilo do cinema japonês dos anos 60.
No século 17, o Japão não está mais em guerra e o país é administrado com firmeza. Hanshiro Tsugumo (Tatsuya Nakadai), um samurai desempregado, bate à porta da poderosa dinastia Ii. Recebido por Kageyu Saitô (Rentarô Mikuni), o diretor do clã, Tsugumo lhe pede permissão de cometer suicídio por harakiri em sua residência. Na tentativa de dissuadi-lo, Saitô lhe conta a história de Motome Chijiwa (Akira Ishihama), um antigo samurai que desejava cumprir o mesmo ritual.
Mais de sessenta anos se passaram desde seu lançamento, mas isso não impede que seja um filme fervorosamente moderno, com uma narrativa surpreendente, reviravoltas avassaladoras e personagens inesquecíveis que representam a personalidade mais complexa do ser humano, a dor mais imensurável, o o ódio mais cego, a imperturbabilidade dos poderosos.
Depois de assistir Harakiri você nunca mais será a mesma pessoa, porque isso vai te mudar de uma forma que só obras-primas podem te mudar. Sutil, detalhado, mas também cheio de significado e camadas, Kobayashi é capaz de filmar com sabedoria e nos lembrar os motivos pelos quais amamos o cinema. São apenas 2 horas e 13 minutos.