SÃO PAULO, SP, 04.10.2022 - O presidente Jair Bolsonaro (PL) se reúne com Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Rodrigo Garcia (PSDB), em SP.

Foto: Bruno Santos/Folhapress

No mês anterior às eleições presidenciais de 2018, o tucano Tasso Jereissati deu uma entrevista em que praticamente decretou a morte do PSDB. Ele listou uma série de erros que levaram à destruição do partido.

O primeiro foi ter questionado o resultado eleitoral de 2014, quando Aécio Neves perdeu para Dilma e levantou suspeitas de fraude que, mais tarde, se provariam infundadas por uma auditoria feita pelo próprio PSDB. O segundo erro apontado por Jereissati foi “votar contra princípios básicos só para ser contra o PT”. O terceiro e maior erro, segundo ele, “foi entrar no governo Temer. (…) Fomos engolidos pela tentação do poder”.

Apesar de ser originalmente um partido de centro-esquerda alinhado aos princípios da social-democracia, o PSDB chegou ao poder e se consolidou nos governos FHC como um partido de centro-direita. Acabou se tornando o principal antagonista do petismo. Durante os governos petistas, o PSDB iniciou uma guinada ainda mais à direita e formou uma base eleitoral composta em boa parte por reacionários que, mais tarde, abraçariam o bolsonarismo. Como bem apontou Tasso, a derrocada do partido começou quando passou a flertar com o golpismo.

O antipetismo alucinado fez com que o partido escolhesse os piores caminhos. Após questionar o resultado das eleições mesmo sem haver indício de fraude, o PSDB ainda atuou firmemente na farsa do impeachment de Dilma, apoiou com entusiasmo o lavajatismo pelo qual foi engolido e depois foi se acochambrar com o governo Temer. O pior aconteceu: a famigerada “Ponte para o Futuro” acabaria desembocando na cova do PSDB.

A sigla começou a agonizar nas eleições de 2018, mas a vitória de Doria no maior colégio eleitoral do país deu alguma sobrevida ao partido. Para ganhar a eleição, o tucano teve que fazer uma campanha ferrenhamente anti-esquerdista, flertar com a extrema direita e trair tucanos tradicionais.

Apesar da vitória em São Paulo, o desempenho do partido naquelas eleições foi o pior da sua história até então. Os tradicionais eleitores reacionários e antipetistas da sigla pularam rapidamente para o barco bolsonarista. Iniciava-se aí a derrocada. Em 2018, o partido perdeu 25 deputados federais em relação a 2014, teve desempenho pífio nas eleições estaduais e, nas presidenciais, obteve apenas 5% dos votos.

Nessa última eleição, o PSDB foi ainda pior. Perdeu mais 9 deputados federais, não elegeu nenhum senador, nenhum governador no primeiro turno e terá muitas dificuldades nos estados em que disputará o segundo. Em São Paulo, perdeu a hegemonia de mais de três décadas e não disputará o segundo turno. Virou um nanico no estado em que até pouco tempo reinava absoluto.

Se foi Doria quem deu sobrevida ao partido na eleição de 2018, foi Doria também quem ajudou a implodi-lo de vez ao colocá-lo no colo do bolsonarismo. Quando o tucano rompeu com Bolsonaro, já era tarde demais. O eleitorado tucano já havia sido engolido pela extrema direita com o partido votando a favor da maioria dos projetos do presidente.

Alckmin trouxe Doria, que o traiu. Doria trouxe Garcia, que o traiu junto com a cúpula tucana. Agora, Garcia trai a cúpula tucana, fecha a tampa do caixão e irá embora antes de apagar a luz.

Em São Paulo, o último bastião tucano, o PSDB boicotou a candidatura de Doria à presidência e abriu espaço para a chegada de um forasteiro, Rodrigo Garcia, ex-vice de Doria. Garcia saiu do DEM com o intuito de herdar o espólio eleitoral dos tucanos no estado, no que falhou miseravelmente ao ser derrotado no primeiro turno. Oportunista – uma característica própria de um afilhado políticoque se preze de Gilberto Kassab –, Garcia previu a provável vitória de Tarcísio no segundo turno e declarou apoio incondicional ao bolsonarista. Sem conversar com a cúpula do partido, o tucano também prestou apoio incondicional a Bolsonaro. Isso fez com que houvesse uma debandada geral no ninho tucano.

Gustavo Covas, irmão do ex-prefeito tucano Bruno Covas, foi um dos que pediu desfiliação. O apoio incondicional de Garcia à direita extremista revoltou ala do partido ligada à família Covas. No ano passado, ao criticar medidas de contenção adotadas pelo ex-prefeito Bruno Covas em São Paulo, Bolsonaro se referiu de maneira covarde a ele como o “outro que morreu”. Bruno Covas, junto com Doria, foi quem trouxe Garcia para o PSDB. Mesmo assim, o ex-governador não hesitou em apoiar Bolsonaro de olhos fechados. Esses são alguns dos requintes de crueldade que envolvem o fim do PSDB. Garcia agora ensaia um retorno ao DEM (hoje União Brasil), que apoia Tarcisio. O afilhado de Kassab já está sonhando com um cargo de ministro no governo Bolsonaro.

Alckmin trouxe Doria, que o traiu. Doria trouxe Garcia, que o traiu junto com a cúpula tucana. Agora, Garcia trai a cúpula tucana, fecha a tampa do caixão e irá embora antes de apagar a luz. Eis o fim trágico do PSDB. O partido, que foi protagonista em seis das oito eleições diretas para presidente desde a redemocratização, virou pó. O antipetismo empurrou os tucanos para a extrema-direita e transformou um gigante eleitoral em um nanico irrelevante no cenário político.

O fim do PSDB é péssimo para a democracia. A polarização PSDB x PT era dura, às vezes agressiva, mas sempre esteve dentro de certos limites civilizatórios. O conservadorismo sempre foi forte no país. O PSDB era quem organizava essa força política até então.

A partir de 2018, a pior face desse conservadorismo, o bolsonarismo, passa a ser o centro de comando, ocupando o espaço de antagonismo ao petismo e extrapolando todos os limites civilizatórios. O fim do velho PSDB fez com que o golpismo e o fascismo fossem normalizados como uma força política legítima. O PSDB é o responsável por deixar ser engolido pelo monstro que ajudou a criar.