Após Jamil Name e o filho serem indiciados pela morte de Matheus, o pai Paulo Xavier diz que espera ter estancado crimes
Nunca mais a vida do capitão reformado da Polícia Militar de Mato Grosso do Sul Paulo Roberto Teixeira Xavier, 42 anos, foi a mesma a partir das 18h do dia 9 de abril de 2019. Naquela noite, ele ouviu barulhos, achou serem fogos, mas quando saiu na rua de casa encontrou cenário de desesperar qualquer pai: o filho, de 20 anos, estava crivado de tiros de fuzil, no banco do motorista da camionete na qual normalmente o oficial buscava os outros dois filhos na escola. No dia, de forma inusual, era Matheus Costa Xavier quem cumpriria a tarefa. Uma obra do acaso, para o pai, “o agir de Deus”.
O instinto natural foi de tentar socorrer o rapaz, levando-o para a Santa Casa de Campo Grande. Na chegada, o policial percebeu o pior: Matheus Coutinho Xavier estava morto. A ficha não demorou a cair: o alvo era ele mesmo. “Minha vida acabou”, resume, oito meses depois, em entrevista ao Campo Grande News, dada após a justiça apontar como mandantes da execução por engano, os empresários Jamil Name e Jamil Name Filhos, presos pela Operação Omertà, no fim de setembro. Outras 5 pessoas foram apontadas como envolvidas na execução, duas delas dois pistoleiros foragidos desde abril.
Da dor de perder um filho e sentir-se culpado, Xavier admite uma espécie de conforto, ao ser perguntado pela repórter sobre os resultados das investigações contra o grupo criminoso, suspeito de atuar por mais de uma década na cidade. “O meu filho serviu a um propósito: evitar mais mortes”. Não é sem demostrar incomprensão que o pai diz isso: “Eu não gosto disso, eu não concordo”, afirma, para depois chegar a citar a mãe de Jesus Cristo, Maria, e sua aceitação bíblica de perder o filho para salvar o mundo.
Vai além. Afirma que foi o erro cometido com Matheus e a indignação provocada por ele, principalmente entre integrantes das forças de segurança, foi um dos fios condutores que levaram ao desmonte da organização criminosa. “Que essas prisões sejam um divisor de águas na história do Mato Grosso do Sul”, observa.
“O pior deles” – “Espero que tenha conseguido estancar o Jamilzinho, que para mim é um psicopata”, dispara, em relação ao empresário mais jovem, hoje preso em Mossoró (RN). A Jamil Name Filho, 42 anos, são atribuídas declarações captadas em interceptações telemáticas dando conta de planejamento “da maior matança” já vista em Mato Grosso do Sul.
Movimentação de equipes policiais no local onde Matheus Xavier foi executado. (Foto: Paulo Francis)
Arrependimento? A força-tarefa responsável pelo trabalho investigatório afirma que a encomenda da morte de Paulo Roberto Teixeira Xavier foi para se vingar do que teria sido considerado pela família Name uma “mudança de lado” do policial. Conforme consta das peças da apuração e acusação já tornadas públicas, ele teria prestado serviços para a família, tempos atrás, e depois de associado a um desafeto, incluindo o apoio numa disputa milionária por terras. Xavier nega.
No diálogo com o Campo Grande News, alega ter sido vítima de perseguição justamente por sua atuação quando comandou unidade central da Polícia Militar em Campo Grande. Afirma que aprendia caça-níqueis e presenciava a operação do jogo do bicho, para os investigadores da Omertà, esquema que foi copiado na criação da organização criminosa destinada a execuções.
Se diz inocente em relação à prisão, em 2009, durante a Operação Las Vegas, contra a jogatina. “Foi uma armação”.
Xavier comenta que quando deixou esse trabalho no centro de Campo Grande, foi procurado por emissário dos Name, o policial civil aposentado Vladenilson Daniel Olmedo, 63 anos, também preso pela operação. Afirma ter recebido um “aviso” e, ao mesmo tempo, convite para atender a família “quando fosse preciso”. Ele admite ter estado com eles em uma situação, justamente quando o empresário assassinado Marcel Hernandes Colombo, 31 anos, considerado outra vítima do grupo, teve desentendimento com Jamil Name Filho, numa casa noturna na Avenida Afonso Pena. “Foi a única vez”.
Na conversa, por telefone, o pai do rapaz assassinado é perguntado se se arrepende de, alguma forma, ter tido contato com os Name. A resposta é falar de seu atual objetivo de vida, segundo ele que a justiça seja feita e que ninguém passe pelo que passou. “Não desejo nem para os executores”.
O policial cita, ainda, o desejo de que, a partir de agora, a investigação de fato siga os tramites e consiga condenar os culpados. Para ele, não há dúvidas. “Não tem como não condenar”.
“Espero que em Brasília, o judiciário não se corrompa”, declara. “Ninguém tem o direito de tirar a vida de ninguém, sob qualquer pretexto”, continua. Em relação aos que cuidaram do trabalho aqui, o tom é de agradecimento, citando o Batalhão de Choque da Polícia Militar, o Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco, Assaltos e Sequestros), o Gaeco (Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado) e ainda o judiciário, que tem mantido as ordens de prisão.
O tom de Xavier é sempre indignado e, se o interlocutor deixar, o policial reformado tem dificuldades de parar de falar sobre o assunto, como é de se esperar de um pai que viu o filho morrer em situação tão complexa. “Meu amado filho está em minha cabeça o tempo todo. O que não posso é deixar em vão a crueldade e a covardia q fizeram com meu filho”, prossegue.
“Estou lutando por justiça não por vingança”, pontua.
Situação funcional – Paulo Roberto Teixeira Xavier é policial reformado desde 2017. Chegou a ser excluído da Polícia Militar em razão de condenação por falsidade ideológica, por manter estabelecimento comercial em desacordo com as regras da corporação. Em setembro, liminar da justiça determinou a volta dele para a Corporação. Como a decisão é provisória, ainda pode mudar.
Atualmente, o capitão fica entre Campo Grande e outras cidades, entre elas a que o pai vive, não revelada, para cuidar dele, depois de acidente vascular cerebral. Indagado se não tem medo de um novo atentado, é categórico: existe esse risco, “com certeza” mas não pretende mudar a postura, que inclui idas frequentes às unidades responsáveis pelas investigações.
Durante ida ao Garras, policial abraça empresário que também se diz vítima de organização criminosa. (Foto: Henrique Kawaminami)
Fonte: Campo Grande News