Afastamento por saúde é coerente e viável
Desequilíbrio emocional do presidente pode ter motivos médicos
James Ackel, na Folha
Ninguém pode esperar que Jair Bolsonaro renuncie. Afinal, se ele fosse um homem de renúncias, não teria chegado ao Palácio do Planalto pelo voto popular. Jair teve todas as chances para desistir ou renunciar ao seu sonho —e não o fez. É o perfil dele, e não podemos esperar que as pessoas fujam ao seu perfil.
Mas um fato inconteste é que, depois de ter vencido as eleições, alguma coisa séria mexeu com o emocional de Jair.
Logo após a conquista, em sua primeira aparição, em vez de buscar equilíbrio nas palavras de um vitorioso, a primeira coisa que fez foi ameaçar esta Folha de cortar as verbas de publicidade do governo.
Por mais que Jair odiasse a Folha, num momento assim seria natural que o eleito agradecesse os eleitores e escondesse seus ódios.
Qualquer estudante de psicologia pode constatar que alguma coisa não estava bem com o eleito Jair.
O tempo foi passando e as situações de demonstração de desequilíbrio emocional foram cada dia se revelando mais agressivas.
O penúltimo pronunciamento em rede nacional mostrou um Bolsonaro em galope de agressividade emocional.
Aí a gente se lembra que algum tempo atrás ele já estava descontrolado com imprensa ou adversários.
As atitudes de Jair, desde o dia da eleição até agora, numa cavalgada de desequilíbrio emocional demonstrado, podem sim ter a ver com as inúmeras vezes em que ele teve que passar por anestesia geral, em curto espaço de tempo, além do estresse do perigo de morte e as paradas cardíacas que enfrentou.
A gente sabe que Jair sempre foi rude, arisco, mas o desequilíbrio emocional demonstrado é um grau muito além de rude e arisco.
O ideal agora seria que Jair pedisse uma licença por saúde, para dar um tempo de recuperação e poder até um dia voltar quando estiver melhor.
Jair não é homem de renúncia, mas pode ser de licença para repouso e recuperação emocional.
Mas enquanto isso não acontece, um fato inédito aconteceu.
Logo após a reunião virtual com os governadores do Sudeste, quando Jair teve um ataque de fúria contra João Doria — e não cabe aqui dizer quem tinha razão —, ele deveria dar uma coletiva de imprensa.
Eis que a coletiva foi cancelada, sabe-se lá por quem, e Jair sucumbiu ao silêncio.
Mais tarde, porém, o vice Mourão, numa coletiva sobre a Amazônia, não se furtou em falar sobre Jair, dizendo que o presidente não usou as palavras adequadas em seu discurso na noite anterior em rede nacional e que o governo continuaria defendendo o confinamento das pessoas às suas casas.
Em palavras diretas, um vice-presidente da República desautorizou pronunciamento superior de um presidente da mesma República.
Vamos lembrar que o general Augusto Heleno voltou de seu afastamento uma semana antes do prazo.
E tudo o que se comenta entre colunas é que o país está sob comando de um quadrilátero do generalato, formado por Mourão, Augusto Heleno, Braga Neto e Fernando Azevedo.
Os mais antigos vão se lembrar de Costa e Silva, presidente no tempo dos militares que por um motivo de saúde saiu de cena e o país passou a ser dirigido por um triunvirato de generais mesmo tendo um vice vivo.
Fonte: Viomundo