Confederação Nacional dos Servidores Públicos alega que a entidade foi criada sem autorização em lei e compromete credibilidade de estatísticas

A CNSP (Confederação Nacional dos Servidores Públicos) enviou nesta 3ª feira (21.jan.2025) uma carta ao Congresso Nacional pedindo a suspensão da criação da Fundação IBGE+. A entidade é uma fundação de apoio às atividades do próprio IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

A confederação alega que a entidade foi criada sem autorização legislativa e opera paralelamente ao IBGE, ameaçando a credibilidade de estatísticas oficiais do Brasil e a autonomia da instituição. Também acusa a gestão do presidente Marcio Pochmann de “investidas autoritárias” que “podem vir a configurar assédio institucional de expressão moral”.

“Diante de flagrantes abusos, a CNSP vem pedir aos Congressistas a adoção de medida legislativa no sentido de sustar urgentemente o ato constitutivo da entidade privada IBGE+, assim como denuncie –no exercício da representação política– o Estado Brasileiro junto à OIT [Organização Internacional do Trabalho], à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e à Organização das Nações Unidas pelas violações atentatórias à liberdade das entidades representativas assegurada universalmente”, escreve. Eis a íntegra da carta (PDF – 385 kB).

A CNSP critica:

  • a criação da fundação sem autorização em lei, por iniciativa unilateral do IBGE;
  • o desrespeito à vinculação ministerial, já que uma entidade precisa ter estar conectada a um órgão que o supervisione;
  • a confusão de papéis e competências com o próprio IBGE e instituições de ensino superior;
  • o risco à credibilidade do IBGE, por ter nome semelhante e atuação paralela;
  • o desvio do teto de gastos, alegando que a fundação burla o dispositivo da União, uma vez que os recursos captados não são recolhidos pelo Tesouro Nacional; e
  • a criação de uma estrutura paralela, que fragmentaria funções estratégicas da União.

Das “investidas autoritárias”, cita manifestações do Assibge (Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE), que já criticaram diversas vezes a gestão de Pochmann por não dialogar com os servidores ao promover mudanças que os afetam. Dentre elas: transferência de unidade, fim do trabalho remoto, mudanças no estatuto e criação da fundação.

Em nota, a presidência do órgão de pesquisas negou as acusações e disse ser alvo de “mentiras” divulgadas por funcionários, ex-trabalhadores e instituições sindicais.

FUNDAÇÃO IBGE+

Criada em 2024, a Fundação IBGE+ é uma fundação pública de direito privado, vinculada ao IBGE. É a maior fonte de insatisfação dos funcionários do órgão, que a chamam de “IBGE paralelo”.

É responsável pelo Núcleo de Inovação Tecnológica do órgão e por apoiar pesquisas. Está vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e não ao Ministério do Planejamento e Orçamento, como o próprio IBGE.

CRISE NO IBGE

Em 7 de janeiro, 2 diretores de pesquisas do instituto foram demitidos. A troca foi divulgada por meio de nota oficial, que não detalhou os motivos. A representação sindical do órgão atribuiu a saída de Elizabeth Hypolito e João Hallak Neto ao fato de “não concordarem com as práticas da gestão” de Pochmann.

Foi divulgada uma carta contra as posturas da presidência, assinada por gerentes, coordenadores e ex-diretores. O episódio representou uma escalada na tensão, que já vinha sendo manifestada pelos funcionários do baixo escalão, que já realizaram greve por 24 horas contra as mudanças estruturais na organização.

A crise no instituto vem sendo usada pela oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em 27 de dezembro do ano passado, por exemplo, ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que a taxa de desemprego no Brasil divulgada pelo IBGE é “uma mentira”. A taxa no trimestre encerrado em novembro foi de 6,1%, a menor do país na série histórica iniciada em 2012.

Em resposta, a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), afirmou em 4 de janeiro que Bolsonaro “ataca” o IBGE porque tem “aversão à verdade”.

A presidente do PT disse que a metodologia usada pelo IBGE é a mesma utilizada em todos os governos desde 2012, inclusive no período em que Bolsonaro e o então ministro da Economia Paulo Guedes levaram o desemprego a 14% –agravado pela pandemia de covid. Em 2021, a taxa de desemprego ficou em 14,6% no trimestre encerrado em maio.

IBGE ERROU MAPA

Sob a gestão de Pochmann, o IBGE lançou um mapa-múndi em que o Brasil aparece no centro do mundo como parte do 9º Atlas Geográfico Escolar. A versão, no entanto, apresentava uma série de erros.

Uma sequência trocava os mapas dos períodos Jurássico (o qual diz ter sido há 135 milhões de anos) e Cretáceo (65 milhões de anos) –diferença de 70 milhões de anos. A sequência também trazia informações incorretas sobre a idade, duração dos períodos geológicos e separação dos continentes no planeta. À época, o IBGE reconheceu as falhas e publicou uma errata.

MARCIO POCHMANN

Indicado pelo governo Lula, Pochmann foi nomeado para o cargo em 18 de agosto de 2023. Já presidiu a Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, e o Instituto Lula. Também foi presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Sua gestão foi criticada internamente por ter supostamente aparelhado o órgão e feito uma administração mais ideológica.

Com visão econômica mais heterodoxa, o chefe do IBGE já fez críticas ao Pix, às reformas trabalhista e previdenciária e defendeu a redução da jornada de trabalho.