Projetos de lei buscam valorizar a oralidade como elemento cultural e combater a discriminação contra o cabelo de pessoas negras

Neste 20 de novembro, 1º feriado nacional da Consciência Negra no Brasil, agradeço ao Poder360 pela disponibilidade deste espaço para refletir sobre 2 projetos de lei voltados à valorização da cultura da comunidade negra do país e o combate à discriminação racial, que exclui pessoas negras das instituições de ensino, do mercado de trabalho e de tantos outros espaços.

Trato dos projetos de lei:

  • 818 de 2024 – que institui a oralidade como elemento da política cultural brasileira; e
  • 253 de 2024 – que dispõe sobre penalidades administrativas contra atos de discriminação ao cabelo natural das pessoas negras.

A oralidade é uma tradição muito arraigada na cultura brasileira, que transmite conhecimentos, história e valores de geração em geração. É um instrumento discursivo que exerce em nossa história o importante papel de preservação da memória das comunidades representativas da população brasileira.

Por ser um aspecto fundamental da nossa diversidade cultural, as falas, os discursos, as línguas e os dialetos precisam ser preservados e mesmo revitalizados pelas políticas públicas. É esse o objetivo do projeto de lei 818 de 2024, o qual sou autora.

Ao abraçar a tradição de oralidade da nossa população, as políticas públicas têm o poder de resgatar a memória da cultura popular e estimular o engajamento e a união social –papel sempre desempenhado pela oralidade e que, mesmo na era digital, ainda segue sendo feito.

Nesse sentido, é necessário o apoio de programas e recursos para armazenamento, gestão, preservação, memória, manutenção e distribuição, garantindo a valorização e o reconhecimento oral das línguas e dialetos locais, possibilitando transversalidade do conteúdo e o acesso às mais diversas camadas sociais de modo a viabilizar os meios de aprimoramento para a educação, a informação e a comunicação.

O decreto 11.453 de 2023, em seu artigo 15, admite a inscrição das propostas dos agentes culturais nos editais por meio da oralidade, reduzida a termo escrito pelo órgão responsável pelo chamamento público.

Esse efetivo avanço na democratização da cultura leva à necessidade de permear toda a nossa legislação federal para adaptá-la ao fomento da oralidade. Entendendo assim é que o projeto de lei 818 de 2024 propõe alterar a lei Rouanet, a Política Nacional de Cultura Viva e a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura para inserir, em seus princípios básicos, a tradição oral como elemento de política pública.

LIBERDADE DE EXPRESSÃO ESTÉTICA

A discriminação contra o cabelo natural de pessoas pretas compõe o racismo que, infelizmente, permeia a sociedade brasileira como uma doença social que impede ou dificulta que o nosso povo seja visto, tratado e respeitado como ele é de fato: etnicamente diverso e com a maioria da população composta por pessoas pretas e pardas, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Recentemente, o LinkedIn, plataforma de networking, divulgou uma pesquisa mostrando que os cabelos de mulheres negras têm 2,5 vezes mais chances de serem percebidos como “não profissionais”, o que causa grande constrangimento e desvantagem às pessoas pretas quando procuram emprego, buscam crescer profissionalmente e estudam no sistema de ensino.

A pesquisadora Sara França Eugênia, do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás, tendo como objeto de pesquisa o cabelo crespo, a transição capilar, o racismo e a identidade negra, percebeu em discussões junto ao Coletivo Rosa Parks a necessidade de uma legislação eficiente com relação à proteção da população negra e de sua liberdade de expressão estética e identitária.

Assim, surge o projeto de lei 253 de 2024, que de maneira inconteste defende o princípio maior do nosso ordenamento jurídico que é a dignidade da pessoa humana.

O projeto da deputada delegada Adriana Accorsi visa a defender a promoção da igualdade racial com a aprovação de penalidades administrativas a serem aplicadas contra atos de discriminação ao cabelo natural de pessoas negras. Essas penalidades são aplicadas tanto às instituições públicas quanto ao setor privado e extensivas ao sistema de ensino e mercado de trabalho, que discriminem o cabelo natural de pessoas pretas, em virtude do corte, adereços ou penteado. Fazendo-se assim cumprir a lei 7.716 de 1989.