São Paulo – A discussão sobre a eleição presidencial de 2022 não deve ser a principal pauta em debate pelos setores progressistas do país no momento. “É uma casca de banana que a direita e o centro estão colocando para a esquerda pisar, escorregar e cair”. A avaliação é do cientista político e ex-presidente do PSB Roberto Amaral. “Discutir candidatura agora só serve para nos dividir cada vez mais, açular as fogueiras de vaidades e nos desviar das questões centrais e imediatas que condicionam inclusive o pleito de 2022”, diz.
Amaral, ex-ministro da Ciência e Tecnologia, menciona três prioridades que, em sua opinião, deveriam concentrar as energias da centro-esquerda do país. “O combate do momento é a defesa da vida. A segunda prioridade é a defesa do emprego. E a outra, o combate ao bolsonarismo. Se ficar discutindo agora se vai ser Lula, Ciro, Boulos, Joaquim, Manoel… É isso que o governo quer, que a gente deixe de fazer oposição.”
Lava Jato e STF
O ex-presidente do PSB lembra que há pendências no Supremo Tribunal Federal relativas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Não temos nem garantia de que Lula poderá ser candidato”, adverte. A Procuradoria-Geral da República (PGR) entrou com recurso contra a decisão do ministro Edson Fachin, que anulou as condenações do petista pela Operação Lava Jato.
O recurso da PGR será julgado pelo plenário, mas provavelmente só depois que a Segunda Turma terminar a análise da suspeição do ex-juiz Sergio Moro. O julgamento está empatado em 2 votos a 2 e foi suspenso por pedido de vista do ministro Nunes Marques, indicado ao Supremo pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga de Celso de Mello. “Não temos nenhuma razão para confiar na Justiça. Temos que nos mobilizar”, alerta o ex-dirigente socialista. “Não sabemos quando essa questão será julgada. Esse ministro pode segurar o caso por dois anos”, diz.
Com a decisão de Fachin de declarar a incompetência do ex-juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, o caso foi enviado para a Justiça Federal de Brasília. O novo magistrado pode anular ou aceitar o inquérito. A validade das provas contra Lula usadas por Moro depende de o então juiz ser declarado suspeito ou não. Se a suspeição for confirmada, as provas serão “imprestáveis”, como diz o jargão jurídico. Do contrário, caberá ao novo juiz decidir se elas valem ou não.
Vácuo na direita
Se Lula e Bolsonaro despontam hoje com potencial de ir ao segundo turno em 2022, com o ex-ministro e governador do Ceará Ciro Gomes (PDT) correndo por fora, não há nenhum nome da centro-direita ou direita que se possa mencionar como competitivo no momento. Mergulhado em divisões internas, o PSDB, por exemplo, que em 2018 fracassou com o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, parece fora do páreo.
Em fevereiro, o partido rejeitou as aspirações do governador de São Paulo, João Doria, que pretendia a presidência da legenda, o que o fortaleceria para ser o nome em 2022. Mas o tucanato freou seu ímpeto e reconduziu o ex-deputado federal pernambucano Bruno Araújo à presidência. Araújo tem mencionado três nomes com possibilidades de ser o candidato: o próprio Doria, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e o senador Tasso Jereissati (CE).
O vácuo no espectro centro-direitista é claro. Mas o que o explica? “É porque a direita se suicidou em 2018. Optou pela extrema-direita, pelo capitão, principalmente o PSDB. Mas hoje está sem quadros, não tem linha, quer fazer oposição a Bolsonaro mas vota com ele (na agenda econômica). Não tem norte. A população que apoia o governo não identifica o PSDB, e a que está contra o governo também não. Estão limbo, e não vão sair”, diz Amaral.
Doria e Ciro
Para Maria do Socorro Sousa Braga, cientista política da Universidade Federal de São Carlos (UFScar), não há um nome ou chapa capaz de rivalizar com Lula e Bolsonaro, pelo menos no momento. “Uma hora eles falam no (ex-ministro da Saúde Henrique) Mandetta, outra hora do (Luciano) Huck. Doria parece ter saído de cena”, avalia. Com a recente derrota no partido, o governador já chegou a admitir que pode se candidatar à reeleição no estado.
Já Ciro Gomes, segundo analistas, parece estar sem foco sobre qual seria seu eleitorado. “Ele está perdido em termos de qual eleitorado está buscando. Tenta acenar para o antipetismo, mas o que sobrou do antipetismo está muito mais à direita, e esse antipetismo tem muita desconfiança do Ciro. Então ele fica em posição contraditória: tem que acenar com uma agenda progressista e ao mesmo tempo dialogar com o antipetismo, que tem uma agenda reacionária”, diz Marco Antonio Rocha, economista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“Para alguns, Ciro é de centro-esquerda. Outros segmentos dizem que está mais para a centro-direita, por conta de sua trajetória partidária”, observa Maria do Socorro. Por outro lado, Ciro foi ministro da Integração Nacional no primeiro mandato de Lula. Seja como for, na opinião da professora, a própria esquerda vai ter que dialogar com a centro-direita para ampliar o eleitorado.
Fonte: RBA