Participantes de um seminário sobre governança pública deram orientações e listaram desafios para a formação de líderes para a prestação de um serviço público de alto desempenho.
As características de um líder público, como um secretário de saúde ou de educação, por exemplo, passam pela capacidade de alcançar resultados a partir da organização de equipe, com foco e inovação.
A formação de lideranças deve passar pela diversidade. Líderes, segundo os debatedores, não devem vir apenas da elite, mas devem também ser pessoas que tiveram menos oportunidades na vida, mulheres ou indígenas.
“Líder é alguém que alcança resultado através de outras pessoas, através de equipes organizadas, motivando, dando apoio a elas para alcançar resultados”, definiu o chefe da Equipe de Emprego Público e Gestão da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Daniel Gerson.
Ele foi um dos palestrantes internacionais no seminário promovido, na terça-feira (5), pela Secretaria de Relações Internacionais da Câmara dos Deputados.
O evento foi o terceiro de uma série de seis seminários sobre governança pública e gestão de pessoas no contexto de reforma do Estado brasileiro.
Os próximos deverão ocorrer no Senado Federal, depois que a PEC da Reforma Administrativa (PEC 32/20) for votada pela Câmara e estiver em análise pelos senadores.
Experiência internacional
Segundo o vice-presidente da Comissão Especial da Reforma Administrativa, deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), que conduziu o seminário, o atual momento é de repensar o setor público.
“Muitos temas tratados como tabu hoje no Brasil a gente percebe, através da experiência internacional, que são práticas consolidadas, como seleção de cargos comissionados, a adoção de práticas de gestão de pessoas no governo.
Então, ao trazer representante internacionais, a gente vai aos poucos quebrando as barreiras”, disse Mitraud.
Conforme ressaltou o presidente da Comissão Especial da Reforma Administrativa, deputado Fernando Monteiro (PP-PE), a PEC 32 trata, entre outros pontos, justamente de liderança.
“É fundamental a atração, a seleção de líderes. Mas é mais fundamental a retenção de líderes.
No Brasil, muitas vezes perdermos grandes líderes, que, desmotivados, saem do serviço público”, enfatizou.
Desafios
A atratividade do cargo de liderança pública no Brasil foi um dos desafios apontados por palestrantes. “As responsabilidades que as lideranças vão ter que assumir em relação a remuneração, ao local, nem sempre são compatíveis com o mercado de trabalho brasileiro.
A gente precisa considerar isso”, disse consultora em gestão Kiki Mori.
Ela também listou como desafios os aspectos de diversidade, especialmente em relação a raça e gênero e as desigualdades territoriais enormes.
“Cargos de liderança regionais são os mais desafiadores. Exatamente na região que mais precisa de políticas públicas, é onde você encontra menos pessoas qualificadas.
Ou não consegue levar para esses lugares pessoas que talvez tenham o perfil, seja por remuneração, seja por estar distante do seu local de origem”, afirmou.
Influência política
Os participantes do seminário chamaram atenção ainda para a grande influência política na escolha de lideranças públicas.
Segundo o representante da OCDE, Daniel Gerson, o processo de escolha deve levar em consideração o fato de que tais cargos exigem habilidades complexas, voltadas não apenas para as autoridades, mas para o setor público como um todo e o privado também.
“As habilidades da liderança administrativa são importantes. Elas são as pessoas que vão transformar a direção política em programas concretos, serviços, intervenções que trazem impacto na base”, explicou Gerson.
Na opinião de Kiki Mori, é preciso construir a blindagem desses cargos de liderança. O gestor, ressaltou, tem que poder gerenciar sua equipe sem interferência externa.
O diretor de Recursos Humanos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), David Bearfield, acrescentou que a seleção de lideranças deve dispor de ferramentas estabelecidas, com critérios de seleção de candidatos.
A entrevista, por exemplo, deve ser baseada na competência e possivelmente feita por profissionais da área.
Cargo em comissão
Também os senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Antonio Anastasia (PSD-MG) criticaram a cultura do cargo em comissão existente no Brasil.
Na opinião de Anastasia, a reforma administrativa deve reduzir o máximo possível os cargos de livre provimento e estimular que lideranças sejam escolhidas entre servidores de carreira, qualificados nesse sentido.
Alessandro Vieira, por sua vez, é autor do Projeto de Lei 3769/19, que institui critérios para a contratação e a ocupação de cargos em comissão e funções gratificadas. A proposta está em análise no Senado.
“O projeto traz critérios objetivos e transparentes para a contratação, em benefício do interesse público, não do político que ocupa o cargo.
Para isso, você tem que selecionar pessoas da forma mais ampla possível, exigindo requisitos de qualificação técnica e que possam ser aferidos no tempo”, defendeu Vieira.
Além disso, cada vez mais, segundo os debatedores, os líderes do serviço público devem inovar, possuir visão estratégica e lançar mão de tecnologias digitais, uma vez que o trabalho deve se basear em dados.
Também participou do seminário o especialista em gestão pública na Austrália Graeme Head.
Fonte: Dourados Agora